Só os apaixonados por comida me entenderão: tem dias que eu já acordo pensando no que vou comer. Aliás, muitas vezes, é o café da manhã que me faz pular antes da hora da cama. Tem dias que as refeições — ou uma em especial — são o clímax, o momento mais aguardado, planejado, até mesmo, dias antes. Acontece também de eu passar dias com a mesma ideia (de comida, claro) na cabeça. É que, às vezes, a vontade é de um sabor, e não de uma receita em si. Então, aos poucos, vou construindo como seria a tradução desse paladar que tanto quero para um prato. Aí passo não só dias pensando na mesma coisa, mas também lendo sobre comida e escrevendo possíveis combinações para testar depois. Coisa de maluco, eu sei.
Coco é a minha fruta preferida e não preciso de motivo extra nenhum para desejá-lo sempre. Ultimamente, porém, ando com vontade de comer coco de todas as formas e todos os dias: coco verde, leite de coco, coco queimado, chips de coco com sal. Chego em casa à noite já feliz só de imaginar o leite de coco com especiarias que vou tomar antes de deitar ou no café da manhã do dia seguinte. É daquelas bebidas quentes que, só de segurar a caneca, já te fazem sentir dentro de um abraço. É conforto puro e, melhor, com uma dose a mais de energia. A combinação de especiarias — canela, cumaru, baunilha, cúrcuma, gengibre, cardamomo — faz dessa uma daquelas receitas boas para curar males do corpo e da alma. Ou seja, é bem-estar na certa. Por isso, meio viciante para mim.
Semana passada o desejo da vez foi um bolo de coco, mas tinha que ser bem cremoso, molhadinho. Não era como um bombocado, a ideia era algo bem leve, delicado e com um pouco de limão. Bom para combinar com o calorão que estava fazendo aqui em Brasília. Levei uns dois dias pensando no tal bolo. Comprei o coco, ralei o coco, fiz um coco ralado queimado. Tudo preparando para o tal bolo. Foi aí que percebi que, mais do que comer, muitas vezes a vontade que tenho é de fazer. De ficar na cozinha entre panelas, fôrmas, o calor do forno e o barulho do liquidificador. Como diz o Léo, ali é o meu reino, onde passo quase todo o tempo quando estou em casa. A vontade era também de experimentar ideias, colocar em prática tantas coisas que fico bolando, dar um descanso para os pensamentos que vivem a mil. Faço isso de duas formas: escrevendo ou cozinhando. Então, bora pra cozinha mais uma vez!
Resolvi fazer, então, uma receita que havia testado há uns dois anos, num aniversário meu e fazia tempos que não repetia. Como já não me lembrava ao certo de como havia feito (sorte que achei uma mensagem que troquei com a minha mãe explicando mais ou menos a receita), devo ter mudando um pouco as coisas. E ficou uma delícia. É um bolo meio pudim, a textura é dada por ovos, coco e rapadura. Não vai nenhum tipo de farinha, boa opção, portanto, para quem não pode ou evita comer glúten. Também não vai nada de leite nem de manteiga.
São poucos ingredientes, todos naturais ou minimamente processados: ovos, coco, rapadura, óleo de coco e raspas de limão e de laranja. Pronto, é só isso mesmo. Eu gosto de usar rapadura para adoçar porque deixa a textura do bolo mais macia e molhadinha. Mas, se preferir, pode usar melado de cana (ou até mel, embora eu prefira deixar o mel para preparações cruas). Para facilitar na medida, eu ralo o coco e a rapadura no ralo grosso. Vou te dizer que é o único trabalho que o bolo dá. E nem é assim uma trabalheira. Cinco minutinhos de esforço para os braços e tá pronto. O resto é só bater tudo no liquidificador e levar para assar.
Se quiser incrementar, pode fazer um coco ralado queimado para cobrir o bolo, como eu fiz. É só pegar dois punhados de coco ralado, espalhar num tabuleiro e levar para assar em forno baixo por uns 20 minutos (depende muito da temperatura mínima de cada forno), até ficar dourado. É bom ficar de olho porque pode passar de coco branco a tostado em questão de segundos. Eu servi o bolo puro, mas ficaria bom também com um sorbet. Eu serviria o bolo quente com o sorbet gelado para ficar um contraste legal. Ou, quem sabe, o bolo frio com uma calda quente. Eu gosto de colocar um pouquinho de raspas de laranja com as de limão. Se não tiver, vá só de limão mesmo que vai continuar delicioso. E, claro, nem preciso dizer, faz toda a diferença usar coco fresco. Nada de pacotinhos, por favor!
Este bolo levei para a turma do trabalho, que estava em comemoração no dia. Meu teste é aquele meu amigo chato pra comer — que adorou o chips de coco queimado com sal —, que, de novo, pediu repeteco! Bom sinal, então!
- 2½ xícaras de coco fresco ralado
- 6 ovos de galinhas felizes
- 5 colheres (sopa) de rapadura ralada
- 2 colheres (sopa) de óleo de coco
- raspas de 3 limões-taiti
- raspas de 1 laranja pequena
- 1 colher (chá) de extrato (e não essência) de baunilha (opcional)
- Preaqueça o forno a 180 °C.
- Rale o coco e a rapadura no ralo grosso.
- Quebre os ovos, um por um, numa tigelinha e passe para o liquidificador.
- Bata os ovos, a rapadura e o óleo de coco até ficar cremoso.
- Junte o coco ralado e as raspas de limão e laranja e bata mais.
- Unte com óleo de coco uma fôrma pequena, de preferência de fundo falso.
- Passe a massa para a fôrma e leve para assar por cerca de 25 minutos, até o bolo ficar dourado e bem assado (só fazer o teste do palito, que deve sair limpo).
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