Acho que acontece com todo mundo, a gente sempre volta diferente das viagens. Não tem como sair para o mundo, ver o novo — as plantas (às vezes tão diferentes, às vezes iguais às do nosso quintal), o jeito de se vestir, de falar, de morar, de se locomover pela cidade, e, claro, de comer — e voltar para casa a mesma pessoa. Algo muda dentro da gente, mesmo sem perceber. De repente, você passa a prestar mais atenção na notícia do jornal sobre aquele lugar. Começa a achar interessante andar pelo centro da sua cidade. Se interessa por aprender uma nova língua ou um instrumento musical. No meu caso, não tem como a mesa e a cozinha aqui de casa serem as mesmas depois de desfazer as malas. Primeiro, a mudança é literal mesmo, já que o que mais trago é louça, panela, ervas, especiarias e livros, livros e mais livros de receitas (e um tanto de anotações). Depois, vou incorporando ideias, técnicas, temperos daquela cozinha à minha. Meus amigos já sabem: quando volto, vou cozinhar algo diferente para eles.
Mas tem uma mudança bem mais sutil e que é a que mais me move a sair por aí: é ampliar a visão. É, de repente, se encantar de novo com algo que sempre esteve ali, na sua casa, no seu quintal, no seu prato. É como se a gente voltasse a ter um olhar de criança, curioso, como se visse algo pela primeira vez. Viajar nos abre os olhos. E isso é muito mais empolgante, para mim, que trazer um ingrediente super-raro e difícil de achar por aqui depois.
Foi admirando o artesanato de povos tradicionais mundo afora, por exemplo, que parei para perceber as belezas das cestarias simples de Minas. Foi comendo bolo de milho crioulo na Bocaina que voltei para casa com saudades das broinhas de fubá da minha avó. Foi visitando produtores, no Uruguai e na Mantiqueira, que me apaixonei pelo mundo dos azeites.
Mais longe de casa, pelo Sudeste Asiático, aprendi a comer e preparar as ramas de batata-doce. Sim, elas são comestíveis (e deliciosas) e já estavam ali no meu quintal sem uso, apenas à espera do meu olhar despertar para elas. Por lá também descobri que as folhas do meu limoeiro, assim como as do limão-kaffir que usam lá, dão sabor a caldos e sopas e um frescor a mais na própria limonada. Já o mamão, que só comia maduro e como fruta, passou a ir para o prato ainda verde, em deliciosas saladas tailandesas, vietnamitas ou laosianas. E até o coração de bananeira, que só fazia refogado, passei a usar muito mais depois que provei cru e vi o quanto era mais gostoso e prático de preparar assim.
E esse novo olhar também acontece com os sabores e ingredientes mais triviais da cozinha. Depois das últimas férias, voltei apaixonada por brócolis. Sempre gostei de brócolis e já falei aqui sobre um assado que é uma delícia. Provei na Cidade do Cabo uma salada de brócolis tostado com molho de vinagrete francês que é um trem de bom. Simples, leve, fácil e tão, tão gostoso que faço toda semana desde que voltei.
Aliás, uma das surpresas dessa viagem foi a qualidade da gastronomia na Cidade do Cabo. Há opções infinitas de bons restaurantes. Mesmo tendo passado um mês lá, ainda deixamos uma lista de lugares para conhecer numa próxima visita (mais que merecida). Dois dos meus lugares preferidos acabei conhecendo no último dia. Um deles é um indiano moderno, o Thali, com cardápio em estilo de tapas. A comida é muito criativa, gostosa, bem temperada. O outro é o La Tête, um restaurante com a proposta de ser do campo à mesa e de aproveitar bichos e vegetais de cabo a rabo. Os pratos são todos sazonais e mudam quase que diariamente, dependendo da disponibilidade dos ingredientes. Eles nem chegam a ter cardápio fixo, as opções são impressas numa folha todos os dias. Usam também muitas plantas alimentícias não convencionais. Comi, por exemplo, uma salada de polvo com pepino e dune spinach, uma panc que cresce em áreas de dunas no litoral entre a Cidade do Cabo e a Namíbia. Léo provou um peixe com mexilhões e um tipo de suculenta local. Entre tantos sabores novos, o que me fisgou mesmo foi o do já tão conhecido brócolis. Mas feito de um jeito tão diferente, que parecia que era a primeira vez que apreciava aquele sabor.
A salada leva pouquíssimos ingredientes. É apenas brócolis, cebola, alcaparras e o vinagrete. O brócolis pode ser o comum, ramoso, ou o japonês, também conhecido como ninja ou americano, aquele bem fechadinho. Gosto de fazer mais com o japonês, acho que, por ser mais fechado, pega melhor o molho. Quanto mais fresco, melhor; então, escolha na feira um bem verdinho, sem estar amarelando (no caso do comum) ou escurecendo (no caso do japonês). Prefiro usar cebola branca pequena, mas pode ser a roxa também. Ela vai crua na salada. Se não curtir muito, pode dispensar. O molho é aquele vinagrete francês bem básico: um bom azeite extravirgem, vinagre (pode ser de arroz, de vinho ou de maçã orgânica), mostarda, sal e pimenta-do-reino. A qualidade da mostarda faz toda a diferença. Eu uso a mostarda fermentada que faço em casa. Se quiser fazer, tem um post ótimo no Tampopo Inspira, da minha amiga Maíra, ensinando o passo a passo. É bem simples e, prometo, você nunca mais vai comprar mostarda pronta. Quem mora em Brasília pode comprar a mostarda que a Maíra faz e vende lá no Varanda Pães Artesanais.
No La Tête, o brócolis é tostado na brasa. Em casa, fiz tanto na brasa quanto na frigideira e dos dois jeitos dá supercerto. Na brasa, gosto de fazer naquelas panelas furadinhas próprias para grelhar, que deixam o alimento um pouco em contato com a chama, mas dá certo em qualquer grelha. Na frigideira (prefira uma antiaderente de fundo grosso ou de ferro), não precisa colocar azeite. Basta esquentar a frigideira, colocar os floretes de brócolis (o suficiente para não lotar a frigideira) e ir tostando, mexendo sempre. Depois que o brócolis já tostado, pode pingar um pouco de água para ajudar no cozimento. É jogo rápido: eles ficam mais gostosos al dente e bem verdinhos. Outro jeito é assar no forno com um pouco de azeite, por cerca de uns 20 minutos, até o brócolis começar a tostar. O molho, que é um curinga na cozinha, vale até fazer um pouco a mais para já temperar a salada da semana, já que dura bem na geladeira. Depois de tudo pronto, é só misturar os ingredientes e se surpreender como que o brócolis de todo dia ganha outra cara de um jeito tão simples!
- um brócolis (pode ser o ramoso ou o japonês; prefiro o japonês)
- uma cebola pequena
- 2 colheres (sopa) de alcaparras
- sal
- Vinagrete:
- 3 colheres (sopa) de azeite extravirgem
- 1 colher (sopa) de vinagre (de arroz, de vinho branco ou de maçã orgânica)
- 1 colher (chá) cheia de uma boa mostarda
- sal
- pimenta-do-reino
- Lave e corte o brócolis em floretes não muito grandes e corte dos talos na base dos floretes (guarde os talos para fazer farofa, picles ou clados).
- Corte a cebola em meias-luas finas.
- Escorra e lave as alcaparras em água corrente.
- Aqueça uma frigideira antiaderente de fundo grosso ou de ferro. Quando estiver quente, acrescente (sem adicionar azeite) os floretes de brócolis e deixe tostar, virando-os com uma pinça de vem em quando.
- Depois de já tostado, se os ramos ainda estiverem duros, pingue um pouquinho de água na frigideira para ajudar no cozimento. Os brócolis devem ficar bem verdes, al dente e tostados.
- Desligue o fogo e passe os brócolis para uma travessa.
- Para fazer na brasa, use uma grelha ou uma panela para grelhar (aquela toda furadinha). Quando os brócolis tiverem tostado de um lado, vire-os. Controle a chama para não queimar demais.
- Para fazer o vinagrete: coloque todos os ingredientes do molho em um pote de vidro com tampa e chacoalhe bem até a mistura ficar homogênea.
- Misture bem os brócolis, as fatias de cebola, as alcaparras e o molho e passe para o prato de servir. Eu gosto de salpicar um pouquinho de flor de sal por cima, mas é totalmente opcional.
- Sirva em seguida.
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