Não sem bem por que, mas raramente compro vagem na feira. Não que eu não goste, acho que é mais falta de costume mesmo. Fico sem saber bem o que fazer com ela e acabo refogando com alho, nada muito elaborado. Já abobrinha não fico uma semana sem trazer na sacola. Eu adoro de todo jeito: batidinha, como comemos lá em Minas; em fios apenas refogada com azeite e orégano fresco; grelhada com lulas e molho de limão-siciliano e hortelã; assada com berinjela, tomates, cebola roxa e alecrim; marinada com azeite, vinagre e pimenta-rosa; até bolo de cacau com ela fica ótimo (a massa ganha umidade e leveza e a abobrinha fica imperceptível, caso isso seja um problema para alguém).
Esta semana, porém, não teve feira no sábado. Pior, não sabemos quando voltaremos a ter. A rotina está toda mudada por conta da pandemia do novo coronavírus. Ficar sem verdura fresca, porém, a gente não fica. Fizemos uma troca entre os vizinhos da rua, uma espécie de escambo do que temos sobrando nas hortas. Isso já é comum por aqui e agora, mais do que nunca, faz muito sentido. Uma vizinha me ofereceu couve e cajá-manga e a sacola veio turbinada com muito manjericão, goiabas brancas e até moringa. Em troca, levei laranjas, pimentas e jabuticabas do quintal. A outra me deu mudas de berinjela e ganhou maracujás, mais pimentas e laranjas. Teve quem comprasse garrafadas e remédios à base de ervas para reforçar a imunidade da vizinhança. E assim trocamos abraços e afagos enquanto o isolamento social é lei.
Está tudo tão diferente nestes tempos que hoje até me deparei com um pacotinho de vagem na geladeira. Minha irmã, que está passando a temporada de “retiro” aqui conosco, foi às compras e trouxe, não sei por que, vagem entre umas três abóboras, que ela e minha mãe, na dúvida, sempre compram mais para mim. Perguntei à minha mãe, que divide a cozinha comigo durante estes dias, o que ela faria com a vagem. A resposta eu já imaginava: iria em refogá-la com alho (os mineiros, na dúvida, refogam qualquer legume com muuuito alho). Bom, já que os tempos são outros e mais do que nunca é preciso evitar qualquer desperdício, resolvi fazer diferente e incluir a vagem no cardápio do almoço de domingo.
Tinha planejado fazer um atum grelhado. E sempre que faço atum, sei lá por que, me vem à cabeça um menu mediterrâneo. Sempre tem o quarteto: tomate, pimentão, berinjela e abobrinha, além de muitas ervas. Evito sujar muitas panelas no almoço de domingo, então, cortei em tiras largas tomates, pimentões e jiló grande (que entrou no lugar da berinjela) e levei para assar até caramelizar com bastante azeite, tomilho da horta e flor de sal. É simples e divino! Para completar os clássicos mediterrâneos, faltava a abobrinha. E, claro, a vagem, que queria (e precisava) usar. Resolvi ser prática e juntar os dois numa salada só. Usei como base a ideia clássica de abobrinha grelhada com pesto. Só que inclui a vagem, também passada na chapa, e usei, além do manjericão da vizinha, outras ervas mediterrâneas do quintal para o molho: orégano, manjerona, salsa e cebolinha.
A ideia do molho foi inspirada nos pestos italianos, com bastante manjericão e azeite. Como queria algo mais leve, abri mão de usar castanhas. Recorri novamente aos clássicos mediterrâneos e me lembrei de um molho à base de alcaparras com mostarda. Essa combinação sempre dá certo. Meu pai, ao fim do almoço, confirmou: alcaparras fazem um molho delicioso, elas dão muito sabor e uma cremosidade ótima. A mostarda também faz a diferença aqui. O ideal é usar uma boa mostarda do tipo Dijon. Eu gosto de fazer a minha em casa, com mel cru ou melado de cana e kefir ou kombucha para fermentar. Na falta e para quem morar em Brasília, minha amiga Maíra vende uma mostarda ótima (tem sempre lá no Varandas Pães Artesanais).
Como os tempos são de aproveitar tudo o que temos em casa, usei uma xícara de manjericão e outra de um mix de ervas frescas do quintal. Se não tiver orégano e manjerona frescos em casa, use uma parte de manjericão e a outra das ervas que tiver. Não recomendo sálvia nem alecrim, porque elas ficam melhores quando passadas pelo calor.
Para montar a salada, é tudo muito fácil. Uma grelha ou chapa de ferro fundido deixam a abobrinha no ponto: tostada e com a textura ainda firme e suculenta. Para isso, o fogo tem que estar bem alto e a grelha, bem quente, untada com um pouco de azeite. Uma grelha ou chapa dessas em casa é uma mão na roda. Tenho uma bem grande, que é ótima, pois consigo grelhar uma quantidade boa de legumes ao mesmo tempo, sem deixá-los amontoados. E faço de tudo nela: depois de fazer a salada, por exemplo, aproveitei a chapa para grelhar o atum. Na falta da grelha, porém, use uma frigideira de fundo grosso, bem aquecida e dose a quantidade de abobrinha por vez. Vai dar certo!
Aliás, deu tão certo que não tenho dúvidas que vagem não será mais novidade nos cardápios aqui de casa.
- 2 abobrinhas grandes
- 250 g de vagem
- 1 xícara de manjericão
- 1 xícara de outras ervas frescas misturadas: salsa, coentro, orégano, cebolinha, manjerona
- ¾ de xícara de azeite extravirgem + 2 colheres (sopa) de azeite para grelhar
- 100 g de alcaparras
- 1 colher (sopa) de mostarda do tipo Dijon
- 3 dentes de alho
- caldo de 1 limão galego ou ½ limão taiti
- um punhado de hortelã
- sal marinho
- flor de sal (opcional)
- Em uma panela média, leve água para ferver. Enquanto isso, corte as pontas das vagens, se preferir. Quando ferver, acrescente uma colher (chá) de sal e afervente as vagens por 2 minutos, apenas até ficarem al dente.
- Escorra a água e passe as vagens sob água fria corrente para parar o cozimento e deixe drenando em uma peneira. Se preferir, pode colocar umas pedrinhas de gelo enquanto as vagens escorrem.
- Prepare a salsa verde: num mixer ou processador, misture o manjericão, as outras ervas, os ¾ de xícara de azeite, as alcaparras, a mostarda, o caldo de limão e uma pitada de sal. Bata tudo até ficar cremoso e homogêneo. Prove a ajuste os temperos: sal, limão ou mais azeite, caso esteja muito espesso. Reserve o molho.
- Corte a abobrinha em rodelas de mais ou menos 0,5 cm. Elas não podem ser nem muito grossas nem muito finas. Corte cada rodela ao meio, formando meias-luas. Reserve.
- Aqueça no fogo alto uma chapa ou grelha de ferro. Caso não tenha, use uma frigideira grande de fundo grosso. Quando a grelha estiver bem quente, unte com uma colher (sopa) de azeite e espalhe a abobrinha, com o cuidado para não amontoar. Se preciso, repita o procedimento.
- Grelhe as abobrinhas em fogo alto por cerca de 5 minutos. Vire-as com uma pinça e grelhe por mais 4 a 5 minutos, até estarem douradas, crocantes e ainda suculentas. Não adicione sal enquanto estiver grelhando para as abobrinhas são soltarem água.
- Passe as abobrinhas grelhadas para uma travessa grande. Regue a grelha com mais uma colher (sopa) de azeite e doure levemente as vagens.
- Passe as vagens para a travessa.
- Misture a salsa verde nos legumes grelhados. Misture muito bem e com cuidado (gosto de fazer isso com as mãos). Reserve uma parte da salsa para levar à mesa à parte.
- Por cima, salpique um punhado de hortelã e flor de sal (opcional).
- Sirva em seguida.
Deixe um comentário